“A Psicologia das Multidões” é um livro que foi publicado originalmente em 1895 e, desde então, tem sido republicado, sendo a última publicação no mercado português em 2023, pelas mãos da editora Alma dos Livros, uma edição que teve por título “A Psicologia das Massas: A Arte de Influenciar Pessoas e Dominar Multidões”. A edição que li data de 2020, publicada pela BookBuilders, com um título fiel ao original.
Este livro é considerado como uma publicação seminal referente à psicologia das massas. Trata-se de um livro interessante de ler, onde Gustave Le Bon teoriza sobre o comportamento global que surge quando um grupo de pessoas se junta em torno de um aspeto comum, onde o comportamento individual é esbatido, e à qual se sobrepõe uma consciência de grupo, uma “alma colectiva”. O comportamento da multidão é apontado como inferior ao comportamento de cada um dos indivíduos que a compõe, podendo apresentar, por vezes, traços destrutivos. Nota-se ainda que o conceito de multidão está para além da simples ideia de pessoas que se encontram no mesmo espaço físico, mas pode estender-se a todos aqueles indivíduos que comungam de um interesse comum que os une. A luz desta ideia, é fácil perceber que algumas das teorias expostas por Le Bom no final do século XIX vêem eco no comportamento das pessoas nas redes sociais.
Historicamente, este livro também é um reflexo daquilo que hoje em dia é comum ouvir-se mas, que nos finais do século XIX, início do século XX, começava a ganhar cada vez mais importância junto da classe política de então: a opinião pública. Esta obra procurou, então, perceber como a opinião pública é formada, e como pode ser moldada. Um dos capítulos é precisamente dedicado às “multidões eleitorais”, com uma análise a como estas podem ser persuadidas e quais as qualidades dos candidatos. Alguns dos comentários poderão ser considerados datados, mas não deixa de ser curioso ver aspectos com os quais ainda hoje conseguimos identificar na vida política.
Apesar de este livro poder ter algum interesse na sua leitura, é preciso ter presente um dos últimos adjectivos atrás referidos: é um livro datado, i.e., tem que ser lido com atenção ao momento histórico e social em que foi escrito. Se, por um lado, identificamos ideias com as quais encontramos algum reflexo nos dias de hoje, por outro lado, há afirmações que podem criar algum desconforto. Por exemplo, muitas vezes é referida a “raça” como um dos aspectos que podem condicionar o comportamento de uma multidão. Hoje em dia, e interpretando o que o autor pretendia transmitir, podemos dizer que o condicionamento cultural e regional, inerente a grupos populacionais, podem sim ter reflexos no comportamento de uma multidão. Outro exemplo, este sim mais grave, mas que na altura, infelizmente, era considerado comum, é a referência a seres inferiores, tais como as crianças e as mulheres.
Como referi, é um livro que deve ler-se tendo sempre presente que é um texto com mais de 100 anos, logo com ideias e concepções sociais bastante diferentes das actuais.