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Ana-b92

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Ana-b92's books

T. S. Eliot: The sacred wood (1997, Faber and Faber)

The Sacred Wood is a collection of 20 essays by T. S. Eliot, first published …

Entrar no bosque: rigor, tradição e risco

Em The Sacred Wood, encontrei um T. S. Eliot crítico que exige precisão do leitor e humildade do poeta. Suas páginas defendem que a poesia nasce menos do ego e mais de uma consciência histórica: a tradição não é museu, é circuito vivo em que cada novo poema reordena o passado. Li “Tradition and the Individual Talent” como quem ajusta lentes; ao aceitarmos a impessoalidade, o poema respira melhor, liberto da confissão direta e da ornamentação fácil.

No ensaio sobre Hamlet, aprendi o peso do “correlato objetivo”: emoções pedem formas adequadas, ou o drama fica turvo. Em “The Metaphysical Poets”, Eliot reivindica energia intelectual na poesia, união de pensamento e sensação que a modernidade diluiu. Ao avançar, senti alternar desconforto e entusiasmo: desconforto por ver preferências minhas questionadas; entusiasmo por perceber critérios que ampliam a leitura, em vez de fechá-la.

Eliot escreve com severidade, mas não com crueldade. …

reviewed Dreamtigers by Jorge Luis Borges (Texas Pan American Series)

Jorge Luis Borges: Dreamtigers (1985, University of Texas Press)

Poems, stories, and personal reflections reveal the interwoven existence of imagination and reality in the …

Tigres que sonham comigo: lendo Dreamtigers

Em Dreamtigers, encontrei um Borges íntimo, sussurrado, que transforma reminiscências em arte breve. O livro reúne poemas, prosas curtas, fábulas e notas que se tocam como espelhos; nelas, a infância, os tigres, as bibliotecas e o tempo se entrelaçam. Li como quem percorre um museu de miniaturas: cada peça guarda um mundo e exige atenção devota. A concisão de Borges não empobrece; ao contrário, amplia o silêncio entre as frases, onde a emoção cresce.

Senti uma alegria melancólica diante de suas obsessões: o sonho que corrige a vigília, o duplo que ameaça a identidade, o labirinto como forma do destino. Quando ele evoca os livros lidos e os não escritos, percebi minha própria dívida com o que recordo mal. A tradução aparece como hospitalidade e risco; o autor sabe que toda palavra é um empréstimo vigilado. A ironia é discreta, a piedade, seca, a inteligência é luminosa.

Fechei …

Günter Grass: The meeting at Telgte (1981, Harcourt Brace Jovanovich)

Telgte, 1647: quando a língua busca abrigo

Em The Meeting at Telgte, Günter Grass encena um congresso imaginário de poetas barrocos no fim da Guerra dos Trinta Anos. Leio o livro como quem cruza uma cidade que ainda fuma. Reúnem-se escritores, tipógrafos e eruditos para discutir a reconstrução da língua alemã, a função da poesia diante da ruína e a possibilidade de um público que ainda saiba ouvir. Entre debates sobre métrica, retórica e pureza do idioma, surgem intrigas, risos, fome, vinho barato e a sombra da censura.

Eu me emocionei com a ambição frágil desses encontros: salvar palavras para salvar pessoas. Grass espelha, com ironia afetuosa, a Gruppe 47 e o pós-guerra, insinuando que cada era refaz seu pacto com a linguagem. O texto é enxuto e teatral, com cenas rápidas e diálogos que tilintam como copos. Quando surge o impressor, senti o peso material da literatura: chumbo, papel escasso, risco em cada tiragem. E …

Jonathan Franzen: Farther away (2012, Farrar, Straus and Giroux)

Cartas da distância: lendo Farther Away com um pássaro no ombro

Em Farther Away, encontrei um Jonathan Franzen mais íntimo e vigilante: um escritor que observa o mundo e, ao mesmo tempo, observa a si mesmo observando. Acompanhando suas viagens e lutos, senti o fio que costura os ensaios: a busca por atenção verdadeira em um tempo de distrações fáceis. O texto-título, na ilha de Alejandro Selkirk, liga a solidão de Robinson Crusoé ao luto do amigo escritor; ali, percebi como a paisagem amplia o silêncio e transforma lembrança em rito.

Ao ler sobre pássaros caçados no Mediterrâneo, doeu-me a precisão serena com que Franzen descreve a violência. Sua paixão ornitológica não é hobby, é ética: olhar, nomear, proteger. Em outro ensaio, ele confronta o culto às “curtidas” e opõe amor, exigente, paciente, falho, à gratificação instantânea. Senti-me interpelado: quantas vezes troco risco por validação? A prosa, clara e densa, prefere a longa frase que respira ideias; entretanto, há humor, …

Jon Fosse: New Name (2021, Fitzcarraldo Editions)

Um nome que reza dentro do silêncio

Ao ler New Name, entrei no fluxo de Asle, pintor solitário à beira do mar, e me vi andando com ele pelos dias curtos do inverno, entre a estrada, o ateliê e o hospital. Tudo acontece como uma oração respirada: frases longas, repetições, pequenas variações que iluminam. Asle pensa na esposa morta, na culpa e na graça; visita o outro Asle, espécie de duplo ferido; conversa com Åsleik, amigo de estrada e de silêncio. A paisagem é quase um sacrário: neve, água escura, luz oblíqua. A arte e a fé ...

Lendo, senti o tempo afrouxar. Jon Fosse me obriga a desacelerar, a escutar as marés dentro das palavras. Às vezes me impacientei; depois percebi que a própria impaciência era tema do livro: a resistência do coração moderno diante do gesto de rezar. No trânsito entre lembrança e presente, o romance pergunta o que pode o amor quando a …

William Faulkner: Soldiers' Pay (1996, Liveright Publishing Corporation)

Retornar sem voltar: minha leitura de Soldier's Pay

Ao terminar Soldier's Pay, senti o peso do pós-guerra nos ombros. William Faulkner acompanha o retorno de um aviador ferido à sua cidade do Sul, onde o silêncio dele fala mais alto que discurso. O jovem chega desfigurado, com a memória falhando, cercado por pessoas que projetam desejos, culpas e esperanças. Há a noiva, cujo brilho social se desfaz ante a ruína. Há o pai religioso, dividido entre fé e desamparo. E há quem o acolha por compaixão, buscando no corpo partido algum vestígio do homem que partiu.

A narrativa alterna vozes, revela fofocas de cidade pequena e expõe feridas morais que a paz não curou. O dinheiro, a honra e o corpo viram moedas de troca. O herói, tornado símbolo vazio, ilumina a hipocrisia coletiva e a solidão dos sobreviventes. Eu li como quem vigia um quarto escuro. Cada gesto simples pareceu decisivo. Cada silêncio, um precipício que …

Bret Easton Ellis: White (Hardcover, 2019, Knopf)

Entre o espelho e o abismo – Minha leitura de White de Bret Easton Ellis

Ler White foi como ouvir uma longa confissão feita em voz baixa, mas com a intensidade de quem já não tem nada a perder. Bret Easton Ellis abandona aqui a ficção pura para expor sua própria visão do mundo contemporâneo – um ensaio-memória que mistura provocação, lucidez e ressentimento. Desde as primeiras páginas, senti que o autor não buscava agradar; ele queria confrontar.

Ellis fala sobre fama, redes sociais, cultura do cancelamento e a perda de autenticidade. Seu tom é direto, quase brutal, e por isso desconfortável. Em muitos trechos, senti raiva e empatia ao mesmo tempo: raiva pela arrogância que transparece, empatia pela angústia de quem observa uma sociedade cada vez mais superficial e polarizada.

O que mais me chamou atenção foi o contraste entre o Ellis polêmico e o Ellis vulnerável. Por trás das provocações, há uma solidão evidente – a de um artista tentando entender …

reviewed India song by Marguerite Duras (An Evergreen book)

Marguerite Duras: India song (1976, Grove Press : distributed by Random House)

O silêncio e o desejo – Minha experiência com India Song de Marguerite Duras

Ler India Song de Marguerite Duras foi como escutar uma música distante, feita mais de ecos do que de palavras. Desde as primeiras páginas, percebi que Duras não escreve uma história comum – ela compõe uma experiência sensorial, um jogo de vozes e lembranças que se sobrepõem, dissolvendo os limites entre tempo, corpo e memória.

O romance – ou talvez deva chamá-lo de poema em prosa – gira em torno de Anne-Marie Stretter, esposa do embaixador francês na Índia. Ela é uma mulher envolta em melancolia, desejada por todos e, ao mesmo tempo, perdida em um vazio silencioso. Ao lê-la, senti como se cada gesto, cada palavra dita ou não dita, carregasse o peso de uma ausência. Duras transforma o exótico cenário colonial em um espaço de isolamento, onde a beleza se mistura à decadência.

O que mais me tocou foi o modo como a autora escreve o …