Clássico atual
5 stars
( sol2070.in/2025/09/cronicas-marcianas-ray-bradbury/ )
Como Fahrenheit 451, outra clássica ficção do mestre Ray Bradbury que consegue permanecer atual é As Crônicas Marcianas (The Martian Chronicles, 1950, 296 pgs).
Mesmo desenvolvendo a ideia, hoje bizantina, de colonizar Marte, o escritor estava muito adiante da ingênua e destrutiva imaginação tecno-política dos anos 50 (que continua até hoje). Ainda é daquelas ficções científicas contra a corrente, que se contrapõem ao tecno-deslumbramento ou tecno-otimismo, como hoje é referida a mentalidade de seita de tech-bros e bilionários, fanáticos pela alta tecnologia como salvação, cegos para o próprio rastro massivo de destruição.
A empreitada é retratada quase como tragédia, uma repetição da autodestruição humana na Terra. Esse é o cenário para imortais dramas humanos: morte, amor, solidão, loucura, migração, nostalgia… Algumas das estórias também refletem questões sociopolíticas críticas como destruição ambiental, racismo e guerra, sem soarem panfletárias.
Quase não é descrito como funcionam as …
( sol2070.in/2025/09/cronicas-marcianas-ray-bradbury/ )
Como Fahrenheit 451, outra clássica ficção do mestre Ray Bradbury que consegue permanecer atual é As Crônicas Marcianas (The Martian Chronicles, 1950, 296 pgs).
Mesmo desenvolvendo a ideia, hoje bizantina, de colonizar Marte, o escritor estava muito adiante da ingênua e destrutiva imaginação tecno-política dos anos 50 (que continua até hoje). Ainda é daquelas ficções científicas contra a corrente, que se contrapõem ao tecno-deslumbramento ou tecno-otimismo, como hoje é referida a mentalidade de seita de tech-bros e bilionários, fanáticos pela alta tecnologia como salvação, cegos para o próprio rastro massivo de destruição.
A empreitada é retratada quase como tragédia, uma repetição da autodestruição humana na Terra. Esse é o cenário para imortais dramas humanos: morte, amor, solidão, loucura, migração, nostalgia… Algumas das estórias também refletem questões sociopolíticas críticas como destruição ambiental, racismo e guerra, sem soarem panfletárias.
Quase não é descrito como funcionam as máquinas do futuro. Então o livro funciona mais como “fantasia científica”, por vezes no limiar da fábula ou até conto de fadas.
Outro fator que torna o livro saboroso é o formato. São contos independentes na maior parte, mas que compartilham o contexto. E ele vai se desdobrando na estória maior da migração humana.
Além disso, há a escrita singela, musical e evocativa como na narração mitológica, em união perfeita com a imaginação luminosa, que consagrou Bradbury. E o estilo foi bem preservada na edição brasileira.
Jorge Luis Borges escreveu no prólogo para o livro (reproduzido nessa edição), em 1955:
Como podem tocar-me essas fantasias, e de modo tão íntimo? Toda literatura (atrevo-me a responder) é simbólica; há poucas experiências fundamentais, e é indiferente que um escritor, para transmiti-las, recorra ao “fantástico” ou ao “real”, a Macbeth ou a Raskolnikov, à invasão da Bélgica em agosto de 1914 ou a uma invasão de Marte. O que importa o romance, ou o romanesco, da ficção científica? Neste livro de aparência fantasmagórica, Bradbury colocou seus longos domingos vazios, seu tédio americano, sua solidão, como fez Sinclair Lewis em Main Street.